Crônicas

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DeletedUser1081

Guest
Temos muitos letrados e com o dom da escrita no TW, está na hora de sair do armário e começar a divulgar seus trabalhos, porque não aqui? Vale também aquele texto humorístico, sarcástico, com moral, etc, que leu e que nunca esqueceu, e que acha legal dividir com a comunidade.

Vamos ler?

Obs.: Não será permitido nada que infrinja as regras do fórum.
 

DeletedUser1081

Guest
Vamos começar...

O ASSALTO

Durante um assalto, o ladrão de bancos gritou para todos os clientes que estavam na agência: "Não se movam! O dinheiro pertence ao Estado, mas suas vidas pertencem somente a vocês!"

Todo mundo no banco deitou-se calmamente no chão. Isso é chamado de "Mudando o Conceito Mental". Mudar a forma convencional de pensar.

Quando uma senhora apresentou-se sobre a mesa provocativamente, o ladrão gritou para ela: "Por favor, seja civilizada, isto é um assalto e não um estupro!"

Isso é chamado de "Ser Profissional" . Concentre-se apenas no que você foi treinado para fazer!

Quando os assaltantes voltaram para casa, o ladrão mais jovem (MBA trainee) disse ao ladrão mais velho (que só completou seis anos na escola primária): "Grande mestre, acho que já podemos começar a contar o quanto nós arrecadamos!"

O assaltante mais velho rebateu e disse: "Você é muito estúpido. Há tanto dinheiro nessas sacolas que vai levar um tempão pra gente contar tudo. Hoje à noite, o noticiário da TV vai informar a quantia total que nós roubamos do banco!"

Isso é chamado de "Experiência". Hoje em dia, a experiência é mais importante do que as qualificações do papel.

Depois que os ladrões saíram, o gerente do banco disse ao supervisor bancário para chamar a polícia rapidamente. Porém o supervisor lhe disse: "Espere, vamos retirar 10 milhões de Reais do banco pra nós mesmos e adicioná-lo aos 70 milhões que já desviamos do banco!".

Isso é chamado de "Nadar a Favor da Maré". Converter uma situação desfavorável em benefício próprio!

O supervisor diz: "Vai ser bom pra nós se houver um assalto a cada mês."

Isso é chamado de "Morte do Tédio". Felicidade pessoal é mais importante do que o seu trabalho.

No dia seguinte, o noticiário da TV informou que uma quantia equivalente a 100 milhões de Reais foi retirada do banco. Os ladrões contaram, contaram e contaram e contaram, mas eles só podiam contar o montante de 20 milhões. Os ladrões ficaram muito irritados e reclamaram: "Nós arriscamos nossas vidas e só levamos 20 milhões. O gerente do banco levou 80 milhões com apenas um estalar de seus dedos. Parece que é melhor ser gerente do que ser ladrão!!!"

Isso é chamado de "Conhecimento Que Vale Tanto Quanto Ouro".

O gerente do banco estava sorrindo, feliz, já que suas perdas no mercado de ações foram agora cobertas por este roubo.

Isso é chamado de "Aproveitar as Oportunidades". Ousadia para assumir riscos!

Extraído e adaptado de Conde de Kakflour.

(Qualquer semelhança com situações vividas no Brasil NÃO é mera coincidência.)
 

DeletedUser1546

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HAHAHA!

Muito boa crônica, inteligente e com um ótimo conteúdo, as perspicácia dos personagens foi o que tornou a crônica ainda mais interessante aos olhos de quem lê e já imagina como se dá o desfecho da situação.
 

DeletedUser

Guest
Laodiceia brasileira

“O sol nasce e ilumina as pedras evoluídas”. Se os “pedreiros suicidas” queriam ganhar o mundo nas próprias rubricas, o gado novo se contenta com o museu de novidades e suas pinturas e dialetos. Palmeiras e sabiás que me perdoem, mas a mãe gentil, patética como toda gentileza hipócrita, tem permitido aos seus filhos o usufruto eterno do berço esplêndido, especialmente por parte daqueles que ignoram as camas de cactos ainda visíveis ao se olhar para um passado absolutamente recente.

Uma das belezas da vida é ser jogado no mundo sem escolher onde ou quando. Talvez a romantismo da Geração Perdida (os sinos batem por ti), ou a psicodelia posterior permitam a pergunta: que diabos estamos deixando no mundo, além de curtidas, indignação de mouse, ‘selfies’ e um volume absurdo de informação inútil?

Ser livre para se expressar é, simultaneamente, pagar o preço de ver idiotices de toda ordem, faz parte do jogo. Mas a terceirização do pensamento é grave, pois tem gerado uma manada incapaz de decidir por si própria: escravos, portanto. E a escravidão moderna se expressa no pleno emprego de um salário e meio; a escravidão moderna se expressa na sensação de elevação de uma ‘classe’ por meio do endividamento em nome de um modelo consumista evidentemente insustentável; a escravidão moderna se expressa nos ‘produtos’ que a sociedade envia a Brasília; a escravidão moderna se expressa no exército de analfabetos diplomados; a escravidão moderna se expressa na aceitação da parte que nos cabe neste latifúndio: ceder mais de quatro meses por ano para o Governo em impostos, enquanto a bolsa da Viúva é subtraída em tenebrosas transações.

Enquanto trocarmos direitos por câmeras, cidadania por dívidas, bem estar por promessas e atitudes por letargia, não precisamos esperar por diversão e arte. Apenas pão, circo e um ‘Deus lhe pague’.
 

DeletedUser1546

Guest
Começou como uma brincadeira. Telefonou para um conhecido e disse:
– Eu sei de tudo.

Depois de um silêncio, o outro disse:

– Como é que você soube?

– Não interessa. Sei de tudo.

– Me faz um favor. Não espalha.

– Vou pensar.

– Por amor de Deus.

– Está bem. Mas olhe lá, hein?

Descobriu que tinha poder sobre as pessoas.

– Sei de tudo.

– Co- como?

– Sei de tudo.

– Tudo o quê?

– Você sabe.

– Mas é impossível. Como é que você descobriu?

A reação das pessoas variava. Algumas perguntavam em seguida:

– Alguém mais sabe?

Outras se tornavam agressivas:

– Está bem, você sabe. E daí?

– Daí nada. Só queria que você soubesse que eu sei.

– Se você contar para alguém, eu…

– Depende de você.

– De mim, como?

– Se você andar na linha, eu não conto.

– Certo.



Uma vez, parecia ter encontrado um inocente.

– Eu sei de tudo.

– Tudo o quê?

– Você sabe.

– Não sei. O que é que você sabe?

– Não se faz de inocente.

– Mas eu realmente não sei.

– Vem com essa.

– Você não sabe de nada.

– Ah, quer dizer que existe alguma coisa pra saber, mas eu é que não sei o que é?

– Não existe nada.

– Olha que eu vou espalhar…

– Pode espalhar que é mentira.

– Como é que você sabe o que eu vou espalhar?

– Qualquer coisa que você espalhar será mentira.

– Está bem. Vou espalhar.



Mas dali a pouco veio um telefonema.

– Escute. Estive pensando melhor. Não espalha nada sobre nada daquilo.

– Aquilo o quê?

– Você sabe.



Passou a ser temido e respeitado. Volta e meia alguém se aproximava dele e sussurrava:

– Você contou para alguém?

– Ainda não.

– Puxa. Obrigado.



Com o tempo, ganhou uma reputação. Era de confiança. Um dia, foi procurado por um amigo com uma oferta de emprego. O salário era enorme.

– Por que eu? – quis saber.

– A posição é de muita responsabilidade – disse o amigo. – Recomendei você.

– Por quê?

– Pela sua descrição.



Subiu na vida. Dele se dizia que sabia tudo sobre todos, mas nunca abria a boca para falar de ninguém. Além de bem-informado, um gentleman. Até que recebeu um telefonema. Uma voz misteriosa que disse:

– Sei de tudo.

– Co- como?

– Sei de tudo.

– Tudo o quê?

– Você sabe.

Resolveu desaparecer. Mudou-se de cidade. Os amigos estranharam o seu desaparecimento repentino. Investigara. O que ele estaria tramando? Finalmente foi descoberto numa praia remota. Os vizinhos contam que a voz que uma noite vieram muitos carros e cercaram a casa. Várias pessoas entraram na casa. Ouviram-se gritos. Os vizinhos contam que mais se ouvia era a dele, gritando:

– Era brincadeira! Era brincadeira!

Foi descoberto de manhã, assassinado. O crime nunca foi desvendado. Mas as pessoas que o conheciam não têm dúvidas sobre o motivo.



Sabia demais.

- Luis Fernando Verissimo





(Post 2)

Sim. De uns 2 anos atrás.
Tem talento, hehe! Foi a unica que voce fez siqueira?

Por favor, evite postagens múltiplas. Use o botão "Editar".
(Al-Iskandar)
 
Editado por um moderador:

DeletedUser

Guest
Obrigado, @Hanubis. Tinha algumas coisas, mas excluí várias. Já tem tempo que não paro para escrever algo. Talvez hoje eu tente. hehe
 

DeletedUser1081

Guest
Nossa!!! Amei seu texto @tdsiqueira, mesmo sendo de 2 anos atrás, ele ainda é mega atual!!! Meus sinceros parabéns!!!

@Hanubis, LFV é LFV!!! Sem comparação... vou postar um dele que adoro tbem!!!


APRENDA A CHAMAR A POLÍCIA

Eu tenho o sono muito leve, e numa noite dessas notei que havia alguém andando sorrateiramente no quintal de casa. Levantei em silêncio e fiquei acompanhando os leves ruídos que vinham lá de fora, até ver uma silhueta passando pela janela do banheiro. Como minha casa era muito segura, com grades nas janelas e trancas internas nas portas, não fiquei muito preocupado, mas era claro que eu não ia deixar um ladrão ali, espiando tranqüilamente.

Liguei baixinho para a polícia, informei a situação e o meu endereço.

Perguntaram-me se o ladrão estava armado ou se já estava no interior da casa.
Esclareci que não e disseram-me que não havia nenhuma viatura por perto para ajudar, mas que iriam mandar alguém assim que fosse possível.

Um minuto depois, liguei de novo e disse com a voz calma:

— Oi, eu liguei há pouco porque tinha alguém no meu quintal. Não precisa mais ter pressa. Eu já matei o ladrão com um tiro da escopeta calibre 12, que tenho guardada em casa para estas situações. O tiro fez um estrago danado no cara!

Passados menos de três minutos, estavam na minha rua cinco carros da polícia, um helicóptero, uma unidade do resgate , uma equipe de TV e a turma dos direitos humanos, que não perderiam isso por nada neste mundo.

Eles prenderam o ladrão em flagrante, que ficava olhando tudo com cara de assombrado. Talvez ele estivesse pensando que aquela era a casa do Comandante da Polícia.

No meio do tumulto, um tenente se aproximou de mim e disse:

— Pensei que tivesse dito que tinha matado o ladrão.

Eu respondi:

— Pensei que tivesse dito que não havia ninguém disponível.

LFV
 
Editado por um moderador:

DeletedUser1713

Guest
Todas muito boas, gostei muito, ainda mais a que @Hanubis postou, muito interessante até o final hehe xD

Vou postar uma que li uma vez no blog do Lissânder Dias, se tiverem interesse de ir ver aqui está o link: http://ultimato.com.br/sites/fatosecorrelatos/


O homem sem nada a perder


Ele não tinha grandes convicções, mas tinha muitas simpatias por tudo que desestruturava: do jeito diferente do corte de cabelo até opções sexuais. Aparentemente, era um cara aberto para o novo – e, julgava assim, portanto, mais inteligente.

Mas, no fundo, seu coração era tão confuso quanto um novato em uma cidade grande. No fundo, não se apegava a nada, nem às bandeiras que ele mesmo defendia. Sua busca deveria ser mais profunda – ele necessitava disso -, mas a verdade é que não tinha coragem de ir até o fim nesta caminhada existencial. Não tinha coragem de encarar suas próprias carências. Contentava-se então com “migalhas” que a sociedade lhe dava, como os “pombos na praça” de Raul Seixas.

O tempo foi passando, e ele já não queria sair de casa, a não ser para sua obrigação diária do emprego que há tempos já não o animava nem desafiava. Uma ocupação mecânica que no início era até ideal: ele trabalhava sem precisar pensar muito durante a semana, e aproveitava o fim de semana para divertir-se. Aliás, não tem coisa melhor para mascarar nosso vazio do que a diversão, não é?

Pois bem, e o tempo passou mesmo. Nosso personagem, que já não tinha grandes convicções, também já não tinha muitas simpatias. Tornou-se um burocrático (no pior sentido da palavra). Pousava de intelectual, mas não passava de um adulto necessitado de uma inocência perdida.

Nosso personagem nunca descobriu que sua vida era uma contradição trágica: a liberdade que havia conquistado não o ajudou e ser mais gente nem o fez mais maduro. Tornou-se mais culto, mas pouco sábio. Ainda hoje, ele suspeita que o colega de trabalho conspira contra ele. Ainda hoje ele pensa que é possível ganhar a vida transformando-se em alguém que não existe.

Coitado do nosso personagem! Vive como se não tivesse nada a perder. Mas mal ele sabe que já perdeu quase tudo.
 
Editado por um moderador:

DeletedUser1081

Guest
Que texto triste @raian.t !!! Mas muito realista, infelizmente, e conheço um par desses... "infelizes". Mesmo assim, parabéns pelo ótimo texto, mas lembre-se de colocar a autoria!!!
 

DeletedUser

Guest
Bons textos. Eu estou enferrujado, preciso voltar a escrever.
 

DeletedUser1713

Guest
Obrigado @Lady Death, existem mesmo muitos destes que são a realidade da sociedade hoje, textos para refletir e pensar em caminhos diferentes para a vida. Aproveitando, peço desculpas pela postagem múltipla :S
 

DeletedUser1081

Guest
Este texto, que li ontem, me tocou a alma e me fez ver o passado amoroso de uma forma menos sofrida e dolorida... com muito gosto o compartilharei com vocês, pois se ele fizer 1% do efeito que fez comigo, já será maravilhosa a experiência!!


Eu acredito em grandes amores.

Mas falo e namoro como se não acreditasse.

Eu não tenho expectativas fúteis para o romance. Eu não estou à espera de sentir aquela sensação estranha de estar a flutuar. Eu sou um daqueles indivíduos raros, talvez um pouco cansados, que realmente gosta deste ambiente atual de conexão entre as pessoas e é feliz por viver numa época em que a monogamia não é necessariamente a norma.

Mas eu acredito em grandes amores, porque já tive um.

Eu tive esse amor que tudo consome. O amor do tipo “eu não posso acreditar que isto existe no mundo físico.”
O tipo de amor que irrompe como um incêndio incontrolável e então se torna brasa que queima em silêncio, confortavelmente, durante anos. O tipo de amor que escreve romances e sinfonias. O tipo de amor que ensina mais do que tu pensaste que poderias aprender, e dá de volta infinitamente mais do que recebe.
É amor do tipo “amor da tua vida”.

E eu acredito que funciona assim:
Se tu tiveres sorte, conhecerás o amor da tua vida. Tu estarás com ele, aprenderás com ele, darás tudo de ti a ele e permitirás que a sua influência te mude em medidas insondáveis. É uma experiência como nenhuma outra.

Mas aqui está o que os contos de fadas não te vão dizer – às vezes encontramos os amores das nossas vidas, mas não conseguimos mantê-los.
Nós não chegamos a casar-nos com eles, nem passamos anos ao lado deles, nem seguraremos as suas mãos nos seus leitos de morte depois de uma vida bem vivida juntos.
Nós nem sempre conseguimos ficar com os amores da nossa vida, porque no mundo real, o amor não conquista tudo. Ele não resolve as diferenças irreparáveis, não triunfa sobre a doença, ele não preenche fendas religiosas e nem nos salva de nós mesmos quando estamos perdidos.
Nós nem sempre chegamos a ficar com os amores das nossas vidas, porque às vezes o amor não é tudo o que existe. Às vezes tu queres uma casa num pequeno país com três filhos e ele quer uma carreira movimentada na cidade. Às vezes tu tens um mundo inteiro para explorar e ele tem medo de se aventurar fora do seu quintal. Às vezes tu tens sonhos maiores do que os do outro.
Às vezes, a maior atitude de amor que tu podes ter é simplesmente deixar o outro ir.
Outras vezes, tu não tens escolha.

Mas aqui está outra coisa que não te vão contar sobre encontrar o amor da tua vida: não viveres toda a tua vida ao lado dele não desqualifica o seu significado.
Algumas pessoas podem amar-te mais em um ano do que outras poderiam te amar em cinquenta anos. Algumas pessoas podem ensinar-te mais em um único dia do que outras durante toda a sua vida.
Algumas pessoas entram nas nossas vidas apenas por um determinado período de tempo, mas causam um impacto que mais ninguém pode igualar ou substituir.

E quem somos nós para chamar essas pessoas de algo que não seja “amores das nossas vidas”?
Quem somos nós para minimizar a sua importância, para reescrever as suas memórias, para alterar as formas em que nos mudaram para melhor, simplesmente porque os nossos caminhos divergiram? Quem somos nós para decidir que precisamos desesperadamente substituí-los – encontrar um amor maior, melhor, mais forte, mais apaixonado que pode durar por toda a vida?

Talvez nós devêssemos simplesmente ser gratos por termos encontrado essas pessoas.
Por termos chegado a amá-las. Por termos aprendido com elas. Pelas nossas vidas se terem expandido e florescido como resultado de tê-las conhecido.

Encontrar e deixar o amor da tua vida não tem que ser a tragédia da tua vida.

Deixá-lo pode ser a tua maior bênção.

Afinal, algumas pessoas nunca chegam sequer a encontrá-lo.

Texto de Heidi Priebe (tradução)
 

DeletedUser1713

Guest
Muito lindo, eu gostei, conheci "o amor da minha vida" e apesar dos pesares posso dizer que existe felicidade em meio a dificuldade e a tristeza... O texto realmente emociona e toca a alma de quem o lê.

Às vezes, a maior atitude de amor que tu podes ter é simplesmente deixar o outro ir.
Outras vezes, tu não tens escolha.

Essa parte a mais profunda.
 

DeletedUser

Guest
Fragmento d'O velho e o mar.

O rapaz levou o café quente até à cabana e sentou-se junto do velho, à espera de ele acordar. Certa vez, parecia que ele ia acordar. Mas recaíra no sono profundo, e o rapaz teve de atravessar o caminho, para pedir lenha e aquecer o café. O velho acordou enfim.

- Não te levantes para cima - disse o rapaz. - Bebe. E deitou café num copo. O velho pegou no copo e bebeu.

- Venceram-me, Manolin. A verdade é que me venceram.

- “Ele” não te venceu. O peixe, não.

- Não. É verdade. Foi a seguir.

- O Pedrico está a tomar conta do barco e da palamenta. Que queres que se faça à cabeça?

- O Pedrico que a leve para armadilhas.

- E a lança?

- Fica tu com ela, se quiseres.

- Quero - disse o rapaz. - E agora temos de assentar as outras coisas.

- Procuraram-me?

- Claro que sim. Os guarda-costas e os aviões.

- O oceano é muito grande e o esquife é pequeno e difícil de ver - comentou o velho. E notou como era agradável ter com quem falar, em vez de falar só consigo e com o mar. –

- Senti a tua falta - disse. - Que apanhaste?

- No primeiro dia, um. Outro no segundo, e dois no terceiro.

- Foi muito bom.

- Agora voltamos a pescar juntos.

- Não. Eu não tenho sorte. Já não torno a ter sorte.

- Para o diabo a sorte. Eu levo a sorte comigo.

- E que dirá a tua família?

- Quero lá saber! Pesquei ontem dois. Mas havemos de pescar juntos, que eu ainda tenho muito que aprender.

- Precisamos de arranjar uma boa lança e tê-la sempre a bordo. A lâmina pode fazer-se de uma folha de molas de um Ford velho. Amolamo-la em Guanabacoa. Tem de ficar afiada; e não temperada assim, parte-se. A minha faca partiu-se.

- Eu arranjo outra faca e trato de afiar a mola. Quantos dias de brisa fresca ainda temos?

- Talvez três. Talvez mais.

- Porei tudo em ordem. Trata de curar as tuas mãos, meu velho.

- Bem sei como sará-las. De noite, cuspi uma coisa esquisita e senti rebentar-me qualquer coisa no peito. –

Cura isso também. Deita-te, velho, que eu trago-te a camisa lavada. E de comer.

- Traz-me jornais de quando andei por fora - disse o velho.

- Tens de te pôr bom depressa, porque ainda há muito para eu aprender e tu és capaz de me ensinar tudo. Sofreste muito?

- Imenso.

- Eu trago-te a comida e os jornais. Repousa, velho. Hei de trazer da farmácia um remédio para as mãos.

- Não te esqueças de dizer ao Pedrico que é dele a cabeça.

- Não. Hei-de lembrar-me.

O rapaz, saída a porta e descendo o caminho aberto no coral gasto, chorava. Nessa tarde, havia no terraço um grupo de turistas e, olhando para a água, entre latas de cerveja vazias e barracudas mortas, uma mulher viu a enorme espinha branca com a portentosa cauda à ponta, que arfava e balouçava na maré, enquanto o vento leste levantava um mar picado e cadenciado, fora da entrada do porto.

- Que é aquilo? - perguntou ela a um criado, e apontava para a longa espinha dorsal do grande peixe, que era apenas lixo à espera de que o levasse a maré.

- Tiburon - respondeu o criado.

- Tubarão. Queria explicar-lhe o que acontecera.

- Não supunha que os tubarões tivessem caudas tão belas, tão lindamente formadas.

- Nem eu - disse o companheiro dela.

Ao cimo da estrada, na sua cabana, o velho adormecera outra vez. Ainda dormia de bruços, e o rapaz estava sentado ao pé dele, a observá-lo. O velho sonhava com leões.
 

DeletedUser1546

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APRENDA A CHAMAR A POLÍCIA
Eu tenho o sono muito leve, e numa noite dessas notei que havia alguém andando sorrateiramente no quintal de casa. Levantei em silêncio e fiquei acompanhando os leves ruídos que vinham lá de fora, até ver uma silhueta passando pela janela do banheiro. Como minha casa era muito segura, com grades nas janelas e trancas internas nas portas, não fiquei muito preocupado, mas era claro que eu não ia deixar um ladrão ali, espiando tranqüilamente.

Liguei baixinho para a polícia, informei a situação e o meu endereço.

Perguntaram-me se o ladrão estava armado ou se já estava no interior da casa.
Esclareci que não e disseram-me que não havia nenhuma viatura por perto para ajudar, mas que iriam mandar alguém assim que fosse possível.

Um minuto depois, liguei de novo e disse com a voz calma:

— Oi, eu liguei há pouco porque tinha alguém no meu quintal. Não precisa mais ter pressa. Eu já matei o ladrão com um tiro da escopeta calibre 12, que tenho guardada em casa para estas situações. O tiro fez um estrago danado no cara!

Passados menos de três minutos, estavam na minha rua cinco carros da polícia, um helicóptero, uma unidade do resgate , uma equipe de TV e a turma dos direitos humanos, que não perderiam isso por nada neste mundo.

Eles prenderam o ladrão em flagrante, que ficava olhando tudo com cara de assombrado. Talvez ele estivesse pensando que aquela era a casa do Comandante da Polícia.

No meio do tumulto, um tenente se aproximou de mim e disse:

— Pensei que tivesse dito que tinha matado o ladrão.

Eu respondi:

— Pensei que tivesse dito que não havia ninguém disponível.


@HAHAHA
 

DeletedUser1546

Guest
Diálogo pós-morte

- Alô ?
- Sim.
- Maria ?
- É ela mesma, quem fala ?
- É o José...
- Ah, sim, tudo bem ? Que que aconteceu ? Tá com a voz estranha...
- Eu estou bem sim, mas...não sei como te falar isso...
- Ora, fale logo! Está me deixando preocupada !
- O Joaquim...teu irmão...faleceu essa madrugada...
- Ah meu Deus...
- Ele morreu dormindo, não sentiu nada. Não se preocupe
- ...
- De manhã quando acordamos, não vimos ele lendo o jornal. Estranhamos e fomos ao quarto ver o que havia acontecido. Ele estava deitado, meio encolhido. Parecia mais calmo que nunca.
- Meu Deus...Não nos falávamos há anos ! Vocês já sabem como ou porquê aconteceu ?
- Disseram que o coração parou. Só isso.
- Meu Deus...
- Ele viveu bem. Não passou sequer uma semana doente. Não sofreu. Morreu dormindo. Eu mataria para morrer dormindo e sem sofrer como ele...
- Sim, ao menos isso...morreu dum jeito bom, se é que isso existe.
- O velório será naquele cemitério que o vô de vocês tá enterrado. Nunca lembro o nome daquele lugar.
- Ah, sei onde é.
- Vai ser amanhã às nove da noite.
- Às nove da noite ?
- Sim...
- Não tem como ser mais cedo ?
- Não, aparentemente muita gente morreu e os horários estão reservados.
- Até quando você morre tem que ficar na fila ! Esse mundo...
- É...
- Mas olhe, aquela lanchonete de lá fica aberta até essas horas ?
- Acho que sim.
- Que bom, não agüento essas coisas sem tomar um cafézinho. Sabe como é...
- Sei sim. Então você vai ?
- Acho que sim, tenho que ver se arranjo alguém pra gravar a novela para mim, senão não sei como farei...
- Ah, entendo...
- Até amanhã, filho. Você serviu meu irmão muito bem todos esses anos. Deixou de ser caseiro e virou um irmão. Obrigado.
- Magina, não fiz mais que minha obrigação. Até amanhã

(Desligam os telefones)

- Maldita velha hipócrita...

Recebi essa um dia desses num grupo de Whatsapp... muito boa! :)
Engraçado que as coisas funcionam assim mesmo, rs.
 
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